1300 – PARA UM MINISTRO DA EDUCAÇÃO NÃO-EDUCADOR


Manuseando um livro da professora Guiomar Namo de Mello, ex-consultora do MEC há tempos pretéritos, deparei-me com a frase “o futuro, agora, pertence às sociedades que conseguirem se organizar para aprender”. O trabalho da Guiomar, Cidadania e Competitividade, poderia ser levado na conta de um bom mote para início de ampla discussão nas equipes dos novos gestores federais, muitos deles sem um mínimo de experiência em gestão educacional pública. Para reflexão e ação contínuas, sem cretinices nem bajulices tecnocráticas, todas bolorentas em plena pós-modernidade, quando o ser humano já fotografa o Buraco Negro inferido pelo genial Albert Einstein.
Os educadores mais bem antenados com os desafios de uma contemporaneidade altamente complexa, estão convergindo para dois pontos considerados indissociáveis. O primeiro vincula-se à importância estratégica da educação fundamental nos países comprometidos com o futuro, tornada pilastra maior do desenvolvimento nacional. Um segundo aspecto diz respeito à revalorização do processo de aprendizagem enquanto tal, abandonando-se o chilicoso que viabiliza algumas páginas em revistas especializadas, para concentrar-se num soro caseiro lê-escreve-conta-e-pensa eficaz, fomentador de um binômio cidadania-profissionalidade , fecundante por excelência .
Em seu trabalho, a revelar uma ímpar maturidade intelectual, a professora Guiomar Namo de Mello confessa o quanto mudou nos últimos anos. Para permanecer defendendo as mesmas ideias basilares, que reconhecem a permanência e a mutação como contrários inseparáveis, como já apregoava Confúcio, apesar de mais de dois mil anos já passados. Uma mutabilidade sequela das profundas alterações tecnológicas, sociais e econômicas acontecidas nos últimos cinquenta anos, que exigem um aprender-desapreender-reaprender permanente, intrinsecamente criativo e fecundante.
A Guiomar, após vivenciar a gestão pública no interior do Estado, tanto no executivo como no legislativo, mudou intelectual e politicamente. Porque amadureceu mais, entendendo que só se deixa de mudar o pensar para melhor no dia que se deixa de viver. E porque melhor compreendeu Fernando Pessoa, poeta e também Álvaro de Campos: “Sou técnico mas só tenho técnica dentro da técnica. Fora disso sou louco, com todo direito de sê-lo”.
Às vésperas do terceiro decênio do século XXI, os projetos de desenvolvimento integrado dos países latinoamericanos devem expressar uma íntima relação entre crescimento e democracia, efetivada através de uma educação fundamental de qualidade, não estatal porque realmente pública, não monopolizada porque desvinculada de partidos e ideologias intransigentes, interesses mesquinhos e imediatistas, modismos doutrinários e pedagógicos, o mérito jamais sendo aviltado pelo fisiologismo banal do clientelismo rasteiro.
O livro da Namo de Mello revela as linhas mestras modernas das principais estratégias de um consistente desenvolvimento: a) educação fundamental ocupando, juntamente com as vertentes de C&T, lugar central na pauta das macro políticas públicas; b) prática educacional inserida no esforço para tomar as sociedades mais igualitárias, solidárias e integradas; c) aquisição de conhecimentos básicos e a formação de habilidades cognitivas, objetivos do ensino, constituindo-se condição indispensável para que as pessoas consigam, de modo produtivo, conviver com ambientes continuamente mutáveis; d) o conhecimento, a informação e uma visão política mais ampla dos valores tornando-se base para uma cidadania em sociedades cada vez mais complexas e cambiantes. E altamente competitivas.
Saber fazer para colher bons resultados, eis o desafio dos que buscam ter através de um ser continuamente integralizador.
Reverencio o educador baiano Anísio Teixeira que admiravelmente sabia se posicionar: “Eu não tenho responsabilidade nenhuma com as minhas ideias. Eu tenho, sim, uma responsabilidade com a verdade”. Quem tem esse grau de maturidade, sabe andar. Quem não tem, apenas continua tecnocratizando burocraticamente mal, atrelado ao me-disseram antissocialmente mundano, politicamente bostélico. Pretendendo, Semana Santa, sair na turma de Barrabás, integrando a ala dos tabacos lesos, gigantemente imbecilizante.
PS. Que saibamos vivenciar uma Páscoa com mais ação libertadora para todos os povos!
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Fernando Antônio Gonçalves é pesquisador social