1293 – GRANDEZAS E PENÚRIAS
Na sociedade moderna, onde um individualismo perverso está asfixiando uma sadia individualidade cósmica, assusta demonstrar solidariedade, manifestar sensações fraternais, condoer-se com os menos favorecidos, ser ombro amigo. Melhor ser solidário à distância, sensibilizar-se com as crianças da Bósnia, horrorizar-se com os massacrados vitimados pelos sectários islâmicos, sair em passeata pelos negros assasinados na África do Sul ou protestar contra o quase findo Maduro. Ser herói na pele dos outros. No Ayrton, que já se foi. No Neimar, o primeiro mega-estrela pós Pelé, o derredor sendo só eu, eu e as minhas circunstâncias neurotizantes, sobrecarregadas de uma ininteligível sensação, a de culpa por ser um animal a nível corporal, e um pseudo-deus a nível egóico, uma contradição que continuamente amplia um viver com medo da existência.
A sociedade moderna foi edificada a partir do desenvolvimento do ego. Mas a sabedoria popular ensina que “quanto mais se verga o arco, mais longe voará a flecha, quebrando-se o arco se a curvatura for excessiva”. As promessas de vida fácil, com muito dinheiro estão multiplicando os otários compulsivos, a compulsão deles bem mais elevada que o apenas racional. E se o idiotizado é honestamente advertido, o otário sente-se ressentido, como se o mundo inteirinho estivesse tentando destruir seu projeto de enriquecimento acelerado.
O florentino Nicolau Maquiavel, autor de O Príncipe, permanente fonte de consulta para politizados de todos os calibres, dividiu os cérebros em três categorias: a dos que pensam por si mesmo, a dos que discernem a partir do entendimento dos outros e a dos que não entendem nem a partir de si nem a partir dos outros. Na categoria última certamente se inscrevem os que perderam sua individualidade através de uma prática individualista mórbida, os fins valendo todos os meios, o “ainda não” sempre substituindo o “por fim”.
Na primeira das categorias de Maquiavel, sem qualquer dúvida, se posicionou a figura sábia do mestre Harbans Lal Arora, serenamente a entender que “para se melhorar a situação presente, o melhor caminho é estar bem consciente de sua enorme dificuldade”. Possuindo a alegria de servir, Harbans era despido das pedanterias academicistas dos que costumam se auto-idolatrar por absoluta ausência de discípulos. Assimilando cotidianamente a imorredoura lição de Spinoza, na sua Ética: “A alegria é a passagem de um homem de uma perfeição menor a uma perfeição maior”.
Saibamos, apesar de todos os senões existenciais, ser radicalmente humanistas, fiéis seguidores de alguns “mandamentos”:
1. Que a produção atenda às reais necessidades do povo, jamais servindo apenas às exigências do sistema econônico;
2. Que a relação entre as pessoas seja de colaboração, nunca de exploração;
3. Que o antagonismo dê vez a solidariedade;
4. Que se empenhe pelo consumo adequado;
5. Que as organizações sociais tenham por objetivo o bem-estar humano;
6. Que todos sejam, na vida social, participantes ativos, sempre de espírito aberto.
Recomendaria aos meus irmãos kardecistas, a leitura de uma extraordinária obra de Francisco Cândido Xavier, o famoso médium mineiro Chico Xavier, um indicado ao Nobel da Paz, em 1981, por mais de 10 milhões de brasileiros, eleito em 2012, em evento promovido pelo Sistema Brasileiro de Televisão, “O maior brasileiro de todos os tempos.” Um médium que devidamente guiado pelo seu guia espiritual Emmanuel editou recentemente, em 2017, O Evangelho de Emmanuel: comentários às cartas de Paulo, BSB, 2017, 874 p. , sexto volume da coleção O Evangelho por Emmanuel. Em páginas memoráveis, segundo Joana de Ângelis, espírito de estupenda vertente analítica, “são oferecidas lições psicológicas modernas e psicoterapias extraordinárias, diretrizes de segurança para o comportamento feliz, exames e soluções para as questões sociológicas, econômicas, étnicas, referente aos homens e às mulheres, aos grupos humanos e às Nações, ao desenvolvimento tecnológico e científico, às conquistas gloriosas do conhecimento, tendo como foco essencial e transcendente o amor conforme Jesus ensinara e vivera.”
Se o caminho se faz andando, caminhemos, sem medo de ser feliz, utilizando um roteiro de segurança, na busca da auto-iluminação, sem embaraços no binômio amor x caridade.
Para ainda um início de ano, às vésperas de Momo, sempre esperando que a vaca tussa de modo mais generoso, recomendaria a leitura de dois textos que muito me impressionaram. O primeiro é Espelho do Ocidente – o nazismo e a civilização ocidental, Jéan-Louis Vullierme, RJ, Difel, 2019. 364 p. Onde se analisa, sob uma perspectiva incomum, as raízes do nazismo, muito mais amplas e profundas que o senso comum, que postula que o fenômeno é produto de uma geração espontânea, fruto de mentes doentias alicerçadas numa ideologia antissemita, ampliada pelas consequências revanchistas da Primeira Guerra Mundial. O livro é fruto de ampla pesquisa, resultado de uma preocupação que atualmente reina no mundo contemporâneo: uma inevitabilidade histórica que pode resultar em maldades já exclusas da história dos amanhãs.
A segunda recomendação é complementar à sugestão acima: A Coragem da Desesperança: crônicas de um ano em que agimos perigosamente, Slavoj Zizek, Rio de Janeiro, Zahar, 2019, 364 p. Um pensador de análises fecundantes, por vezes bastante inquietante, sobre as luzes de um fim de túnel que nada mais são que o farol de um trem acelerando em nossa direção. E só quando admitirmos que a situação é absolutamente irremediável e sem esperança, as mudanças serão possíveis. Slavoj é considerado o filósofo mais perioso do Ocidente, segundo o The Guadian. Leitura para desabestalhados de nível superior.
POR QUÊ? O QUE NOS TORNA CURIOSOS
Mario Livio, Rio de Janeiro, Record, 2018, 252 p.
E buscaram responder algumas perguntas existentes no livro, esclarecendo as razões pelas quais a curiosidade é o ingrediente principal da criatividade em todos os ramos de vida, além de principal agente motivacional:
– As crianças são mais curiosas que os adultos?
– A curiosidade é um produto direto da seleção natural?
– Por que algumas questões aparentemente triviais nos deixam curiosos?
– Por que nos esforçamos tanto para decifrar os sussurros de uma conversa na mesa ao lado de um restaurante?
– Como a nossa mente escolhe os objetos de nossa curiosidade?
A leitura deste livro irresistível e muito divertido, muito poderá ampliar os hábitos de leitura e pesquisa de jovens e adultos que tremem diante de qualquer obstáculo cognitivo encontrado, acovardando-se e pondo tudo nas mãos do Criador, ampliando ignorâncias e complexos, provocando ingenuidades dos mais diferentes níveis, imaginando-se ainda os últimos da espécie.
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Fernando Antônio Gonçalves é pesquisador social